Com apoio do ICMBio, IGc realiza divulgação científica de estudos em paleoclima no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu (MG)

Por Karolina von Sydow

Gruta do Janelão e o Rio Peruaçu. Crédito: Lillian da Silva Cardoso.

O Brasil apresenta uma rica geodiversidade e muitos elementos destas paisagens possuem importância científica, histórica e cultural. As cavernas, por exemplo, constituem testemunhos geológicos subterrâneos e são formadas, através de um processo de dissolução de rochas, ao longo de milhões de anos. O Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, localizado ao Norte do estado de Minas Gerais, reúne belas paisagens, incluindo este tipo de relevo cárstico, além de colecionar registros em artes rupestres e histórias curiosas locais, que podem ser descobertas por meio da própria comunidade.

O projeto científico

Em 2017, iniciaram-se as pesquisas científicas relacionadas às mudanças climáticas e à reconstrução da história das monções na América do Sul, utilizando os anéis de crescimento de árvores e espeleotemas das cavernas. O projeto denominado PIRE: Climate Research Education in the Americas using Tree-ring speleothem Examples é coordenado pelo Professor Francisco William da Cruz Junior,do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP), e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) na modalidade de projeto temático.

A iniciativa conta ainda com a colaboração de dezenas de cientistas brasileiros e de outros países para disseminar as pesquisas científicas, que vêm sendo realizadas pelos Grupos de Estudos em Educação e Pesquisa em Clima das Américas, em 2019, e propostas de ações junto à comunidade local, em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão ambiental do Ministério do Meio Ambiente (MMA), responsável pela gestão do Parque.     

Objetivo e importância da iniciativa

Como coordenador do projeto, o professor Francisco propõe também a divulgação da pesquisa sobre mudanças paleoclimáticas e paleoambientais junto aos moradores da região, visitantes do Parque, comunidade acadêmica e sociedade em geral.

“A nossa proposta é apresentar como os espeleotemas e anéis de árvores desta região podem ser elementos importantes para explicar eventos de mudanças climáticas ocorridas no último milênio na América do Sul. E descobrir se estas variações podem ser consideradas globais ou regionais”, destaca ele.

“Com base nestes registros geológicos e biológicos, é possível realizar uma reconstituição das variações climáticas e dos fatores naturais que causaram mudanças no clima da região. Um dos objetivos seria comparar com o clima das últimas décadas, quando a região sofreu “forte presença antrópica”, complementa.

Professor Doutor Francisco William da Cruz na caverna do Parque. Crédito: Francisco da Cruz.

Para estudo dos paleoclimas, os pesquisadores focam nos cinco tipos de árvores existentes na região. O método científico denominado “dendrocronologia” se baseia no estudo de amostras de anéis de troncos para descobrir as idades das árvores, que são escaneadas e observadas em laboratório. O processo é estratégico e possibilita a datação de regimes climáticos antigos.

Os registros climáticos também são estudados a partir dos espeleotemas, formações rochosas carbonáticas que ficam dentro das cavernas do Parque. “Todo espeleotema precisa de água para crescer. Neste sentido, através deste, dá pra saber se em certo tempo geológico choveu muito ou pouco” explica o professor Francisco.

Projeto de divulgação para a comunidade unifica saberes

A estudante do Curso de Licenciatura em Geociências e Educação Ambiental da USP, Lillian da Silva Cardoso, destaca a importância social do projeto, que vai além do papel de difundir informações científicas. 

“Por meio de entrevistas e realização de eventos, como o World Café (uma metodologia participativa de diálogo e colaboração), buscamos descobrir como é a relação entre os moradores e o Parque e compreender suas demandas atuais”, conta.

“Com isso, a nossa missão é conectar conhecimentos culturais e históricos da comunidade com as descobertas científicas dos pesquisadores. A partir de dados coletados, vamos sugerir projetos específicos que atendam às demandas locais e realizar ainda um trabalho educativo e de divulgação científica”, explica ela.

Lillian explica aos participantes do World Café como são descobertas informações climáticas, através do estudo de anéis de árvores. Crédito: Denise de La Corte Bacci.

Para direcionar o trabalho de divulgação, o projeto conta com a colaboração e experiência da Professora Doutora do IGc e integrante do  Núcleo de Apoio à Pesquisa em Patrimônio Geológico e Geoturismo (GeoHereditas), Denise de La Corte Bacci, que atua na área de ensino de Geociências, geoconservação, formação de professores e Educação Ambiental.

“O Parque não possui apenas valor científico, mas social e ambiental também. A minha expectativa é trabalhar em conjunto com os moradores, condutores ambientais e com os gestores, de forma humanizada, para valorização da área e cooperação em ações de educação ambiental e geoturismo na região. Tudo isso para que o sentimento de reconhecimento e pertencimento local seja cada vez mais reforçado”, ressalta a professora.

Professora Denise de La Corte Bacci registra pinturas rupestres feitas nas rochas. Crédito: Lillian da Silva Cardoso.

Curiosidades sobre o Parque do Peruaçu e região

O Parque Nacional Cavernas do Peruaçu é uma unidade de conservação, desde 1999, com uma extensão territorial de mais de 56 mil hectares, abrangendo os municípios mineiros de Januária, Itacarambi e São João das Missões. A região concilia dois biomas extremos, Cerrado e Caatinga, alternando períodos de alta umidade e seca, quando a população tem acesso limitado à água no dia a dia.

Atualmente, o Parque oferece aos visitantes vários passeios, que incluem trilhas, acesso a mirantes e a sítios arqueológicos, com auxílio de condutores ambientais capacitados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Pesquisadores da USP na trilha para a Gruta do Janelão, em julho de 2019. Crédito: Lillian da Silva Cardoso.

A Gruta do Janelão, por exemplo, com mais de 100 metros de altura e quase 5 km de trilha (ida e volta), é o principal atrativo do Parque, recebendo milhares de visitantes anualmente. A caverna foi formada pelas águas do Rio Peruaçu, que dissolveram as rochas calcárias formando cânions de 200 metros de profundidade.

A gruta apresenta ainda registros geológicos marcantes, com destaque para a maior estalactite do mundo, chamada de “Perna da Bailarina”, pinturas rupestres e marcas históricas das primeiras ocupações humanas na região.

Locais de importância geológica e científica como, o Parque Cavernas do Peruaçu, necessitam de pesquisas científicas, ações educativas e de divulgação que auxiliem na conservação da geodiversidade e biodiversidade, com envolvimento de instituições governamentais, pesquisadores e comunidade local.

Perna da Bailarina, a maior estalactite do mundo, com 28 metros de comprimento, vista da Dolina dos Macacos. Crédito: Lillian da Silva Cardoso.
Detalhe da “Perna da Bailarina” na Gruta do Janelão. Crédito: Denise de La Corte Bacci.